Quem tem de temer o ódio e o frio, jamais se sentirá a vontade com calor ou apresso. Aquele que desconheceu o amor durante a vida carrega uma marca imensurável que não deve cicatrizar, nem sob decreto. A verdade? Ah, é difícil discorrer sobre aquilo que se passa dentro do próprio ego. Coração? Desconheço. Minha alma e essência é tudo o que me resta em vida. Mas, sou livre.
– Adeus, querida. – Dizia em seu instinto fatigado, meu pai, sangue de meu sangue, caído como um animal abatido em meio aos demais corpos de seres amados, vítimas de meu desmazelo. Minha linda Siena, seus vinhedos verdís cintilando ao sol, a luz rarefeita do fim de tarde sucumbindo ao calor do mesmo, tudo contrastava com a devastação mortal da contrada dell'aquila, terra minha, pedaço da carne que me compunha, meus ossos frágeis, inúteis. – Já não empunho lanças mortíferas, nem o pensar angustiado. Deixo-te o inverno que se aproxima, doce Enloya. O frio que gela a alma inquieta, os horizontes obscuros e a linha tênue entre a luz entre as trevas. – Assim falávamos, como grandes viventes dos séculos passados que descobriram uma forma de sobreviver à modernidade. Era dessa forma que Siena respirava, ela e todos os seus filhos.
Os dedos calejados que antes empunhavam a vingadora fiel, sua belíssima Desert Eagle de aço crispano, mais rápida do que o sujeito poderia pensar... E, ainda assim, havia falhado. Os mesmos membros tocaram minha pele alva completamente lavada por lágrimas e pó, tão pitoresca... Indigna do título de condessa. – Deixo-te a solidão e a vergonha deslavada. Terás de viver com as duas pelo resto da vida, até que estejas forte o bastante para vingar-nos com sangue e honra. – Por fim, em seu âmago melodramático, os olhos cerraram por vez, abandonando-me ao léu.
“Pai...”
Minha mãe, tão linda com seus cabelos dourados, reluziam diante dos vestígios de sangue rubro que tingiam a pele. Foi nas férias de verão de meu último ano em Hogwarts, estava formada e era uma bruxa adulta, então, lá estávamos nós, os Rinaldi, tão gelados que nem parecíamos frutos dos raios de sol italianos. A única sobrevivente: Condessa Rinaldi. Hoje vivia na casa da família. Sozinha, com a companhia de um cachorro e alguns empregados de confiança, não havia muito o que fazer além de remoer as lembranças que tentavam o cérebro a jamais desistir de remoer. Assassinados. Todos eles. - Vinde a mim sombra! Carregue meu corpo para longe! Solte-o na névoa e liberte-me destas amarras. – Debruçada sobre o peitoril de ébano, contemplava com êxito a monção estrelada que percorria os céus de anil. Cansada estava de viver sempre cambaleando entre a multidão, os burgueses nojentos que passavam por mim indiferentes, como se aquela que uma vez fora condessa e governara muitos dos maiores vinhedos de Siena, fosse apenas escória social, fadada a aprisionar o ego entre veias peçonhentas. Rostos anônimos, desprovidos de significado. Posso ouvir seus passos lentos, pesados, sem rumo.
O clamor queimou os pulmões que me adentravam as vísceras, saindo como fumaça pela garganta. Na direção que tomei na vida, ninguém, só a vasta opressão do que é vazio e cinzento, a eminência da cólera que se abria em abismos sob os pés cansados de estar sempre em cima de um par de saltos desconfortáveis. O fantasma da nobreza jamais deixaria de me assombrar, suas mãos apertavam meu peito e os dedos circundavam o coração, me sufocavam em meio a tanta penumbra. Era o fardo dos Rinaldi de 500 anos que carregava. O rosto tétrico me espreitava sem louvor algum, o tênue limite que me sustentava era o mísero fio entre a vida e a morte. Abro os olhos, o súbito movimento de pálpebras era, no entanto, uma defesa lúcida contra a brisa noturna que lufava em meus cílios. Acordada, lamento: O sonho não era tão diferente da vida real.
[Ojesed] - Maior Sonho: Ser motivo de orgulho em Siena e honrar sua linhagem.
[Bicho Papão] - Maior Medo: O homem que matou sua família.
[Dementador] - Memória: Ver todos os parentes e seus entes queridos mortos no chão do salão de festas após o Baile da Colheita quando tinha dezoito anos.
[Testrálios] - Viu a Morte?: Sim. Uma vez, porém de muitas pessoas.