Seja homem. Seja honrado. Não seja marica. Não seja fraco. Seja, ser, não ser.
Fácil dizer o que devo ser, difícil dizer quem sou. Porque sou filho, sou tradição, sou legado, mas, acima de tudo, sou aparência.
Criado em uma tradicional família sul-coreana bruxa e sendo o primeiro descendente homem, difícil fugir desta sina. Sempre carreguei a cada passo o olhar crítico, as expectativas e as diretrizes de meus pais e por mais incômodo que tenha sido tudo isto, ao menos não posso dizer que eles eram injustos: trataram com igual rigor minha irmã. Não que seja algo bom, mas era um fato. Infeliz, mas um fato.
Tendo esta introdução, não deve ser de se espantar que minha criação quando pequeno foi rigorosa. Estudei línguas, aritmética, conhecimentos sobre a sociedade bruxa como um todo, música e tae kwon do, que dentre tudo era algo que eu realmente apreciava. Aos poucos, fui me tornando o filho que meus pais sonhavam e que eu, vendo-os como meu mundo, mantive, sem questionar, apreciando cada aprendizado e julgando-me afortunado por tudo o que tinha. Em parte, de fato era.
Veio então meu décimo primeiro ano e com ele o início dos estudos em uma instituição bruxa. Para tornar-me o homem que meus pais ansiavam, fui enviado a Durmstrang, onde os rumores diziam que a educação era mais firme. Ali pertenci à Leshiy e posteriormente à Romanov e neste tempo descobri que a disciplina ali existia, tanto quanto existiam os caminhos que desvirtuavam.
Foi em Durmstrang que me tornei forte, hábil e um bom bruxo, mas também foi onde conheci o obscuro e descobri duas novas paixões. Uma delas se mantém esquecida, uma aventura de tempos antigos. A outra, foi a dança. Uma aula, apenas uma, a qual visava abordar formas diferenciadas de trabalhar a disciplina, a autoestima, a coordenação. Um experimento e, mesmo assim, apaixonei-me, treinei e tornei-me excelente, tanto quanto era no tae kwon do. Sendo controlado e introspectivo como era, a luta acabava por ser a forma de livrar-me da frustação e liberar o mais intenso, enquanto a dança era minha forma de expressão.
Naturalmente que com o fim dos estudos todas as paixões se foram e com elas vieram as obrigações. Tornei-me medibruxo especializado em acidentes e vírus mágicos e ali minha vida se estabilizou até a tormenta, pontuada pela fuga de minha irmã, que trouxe consigo um baque para meus pais. A culpa, o erro, ante os olhos deles, eram dela tanto quanto deles que haviam falhado em sua criação. Eu, então, vi-me como a última esperança.
Se antes o fato de ser o filho que eles desejavam pesava, isto triplicou. Não queria ser mais uma “decepção” para meus pais que, provável, não aguentariam outra surpresa. Conformei-me. Dali para cá, segui o que precisava, sem mais esperanças de um dia encontrar o caminho para mudar o que fosse. Viver já não mais me pertencia, bem sabia, assim sendo, passei a existir.